domingo, 19 de setembro de 2010

Estorinha de dois

A necessidade de escolher uma música para fofocar seu sentimento para ela se fazia presente. A inquietude das pernas por não saber caminhar com as palavras era tamanha que, por razões do coração -isto é, nenhuma - perambulava pela cidade ouvindo sua lista de músicas previamente selecionadas para o momento.
Sempre presente, as canções lhe pareciam corajosas, transparentes, transcedentes, multi-significativas... São o que ele queria ser, mas nunca teve a audácia de sê-lo de fato. Ele era aquilo: só um, comum, simplório, típico, um outro... mas diferente em sua semelhança com os demais.
O cabelo era comum, mas o penteado não. O corpo era mais um, mas o desenho não. As roupas eram típicas, mas a combinação não. Os tênis eram os de sempre, mas as solas eram gastas de forma diferente, pois seu andar era torto. O só um era um só, enfim.
O que sentia era forte. O céu, que mais parecia uma sacola plástica cheia de água recém rasgada por uma faca luminosa, fazia o papel de seus olhos. O sol disputava uma ponta da estória com ela, que lhe esquentava o peito e mais.
Ela também era daquele jeitinho usual, que, de tantos vestidos iguais pela cidade, de tantas blusas quadriculadas e de tantos óculos retangulares vistos por aquele litoral, quase nada fazia dela uma menina digna de destaque. Mas ela era. Talvez aquele par de sapatos vermelhos, talvez a beleza de seus lábios levemente pintados, talvez aqueles cabelos pretos de boneca... Por um apanhado de coisas desse tipo, certamente.
Ele nunca vira alguém assim. Ela já... vários. Vários tipóides como esse. Mas nunca conversaram, pois a canção certa nunca foi escolhida.

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