quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Encontro e Desencontro

Você está prestes a conversar com aquela garota linda que apareceu bem na sua frente. Aquela garota magrinha, com um ar de perdida, mochila nas costas, chegando de viagem. Pois bem, as probabilidades quase nulas se anunciam. Ela vem em sua direção, esboçando um quê de preocupação.
Ela quer saber onde fica um tal hotel de sua cidade. Saca um pedaço de papel com o endereço e pergunta como chegar lá. A sua reação é ficar sem nenhuma, estático por sete segundos. Mas, em vão, tenta não demonstrar ainda mais surpresa e lhe dá a direção aonde ir, como chegar. Por ironia, coincidência ou não, fica perto de onde tem de ir. Logicamente, você se oferece para acompanhá-la, afinal, sua cidade não é das mais pacatas e seguras. Ela sorri e agradece.
No caminho, ela conta que está indo ver seu caso. Você não se abala, pois a conversa flui naturalmente e vocês riem e conversam como se se conhecessem há alguns anos. Aí se pergunta por que há sortudos e por que há você. Acredita, por um minuto, na sorte. Mas não na sua. A sua não existe.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Pinta esse quadro:

Quem disse que conversar sobre religião não leva a lugar algum? Quando um católico, um testemunha de Jeová, um agnóstico e um ateu se reúnem, leva. O conhecimento de cada um é partilhado, compreendido, absorvido, analisado e comentado. As perguntas não se calam, os cigarros não se apagam, as garrafas não acabam, as risadas não cessam e o trabalho não se cansa de chamá-los.
Os corpos se dispem daquelas tristezas e alegrias e a boca se fecha por um instante para que os ouvidos ingiram uma lição acertada. Ficam sérios.
Chega a risada estridente e, ao serem contadas histórias da infância e da adolescência, os corpos rolam na pedra áspera.
As chamas insistem em se apagar, mas a vontade de que o momento dure por mais vinte tragos é tamanha que uns saem para comprar mais veneno. Saem, mas voltam. Com a geladeira e a piteira abastecida novamente, continuam.
Ah, o trabalho! Monta esse armário!
Ébrios e com as bocas metralhando blasfêmias bem humoradas, finalizam o que fingia ser um objetivo impossível.
O miado esquisito e a sinfonia de sopros se calam e o mundo dorme já de manhã. A baixeza e a inocência das brincadeiras dão lugar ao sono e tudo acaba em sujeira, dever cumprido, satisfação e certeza de que amigos a gente leva no coração, no gargalo e nas marteladas. Apagam-se os cigarros, finalmente.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Balanço(a) do ano.

Ao ponderar durante dois cigarros sobre o que você fez ao longo do ano que passou, você perceber que ele foi só um trago na vida não é lá muito bom. Será?
Você viveu trezentos e sessenta e cinco goles de cerveja da sua vida e, praticamente, não saiu do lugar. Teve uns doze beijos de motivo para se interessar por alguém e fazer com que ela se prendesse a você, mas não o fez. Passou mais de duas mil lições de momentos relevantes, somente por volta de dez shows de situações marcantes e mais de cento e quarenta e três mil palavrões desnecessários.
E para quê? Para ficar sete quilos mais experiente, oras.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Delícia de estorinha.

Após mais um fim de semana diferente e inesquecível, ele chega em casa cansado e com as pernas doendo. Eis que surgem ligações e mensagens de ambas as partes. As primeiras horas da semana útil ia ser, no fim, a chave de ouro a fechar tudo.
Seu corpo leve o esperava sobre a mureta da orla da praia. Uma noite de clima agradável que lhe exigiu nada mais que uma blusa confortável e um par de jeans. A cara limpa, sem nenhum artifício para falsificar uma beleza chata e comum, a fez ainda mais bonita. As marcas e covas eram lindas e o sorriso parecia ainda mais verdadeiro.
Era aquela garota que diriam comum - e talvez até fosse. No entanto, ela não se fazia nada comum para ele. Um moleque largado, sabe-se lá por quê, jogou um casaco sobre si mesmo antes de sair para encontrá-la.
Durou pouco. Mas foi bom. Uma volta pela orla acompanhados de casais, solitários possivelmente em busca de descanso e uns poucos trabalhadores que ali figuravam, mas sozinhos.
Algo que o remeteu a anos atrás, uma época muito inocente. Não havia inocência, porém. A culpa o consumia ao mesmo tempo em que era apenas uma especiaria que dava mais gosto ao momento.
E ela alegre. Tocava-lhe a cintura, as mãos e os braços a todo minuto.
Passou. A semana começaria logo após.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Felicidade

Quando um amigo cutuca o outro e lhe grita que agora vai ser a melhor de todas, a mais conhecida. Quando você olha para trás e tem uma garota chorando de felicidade. Quando tem vários amigos se abraçando, sorridentes. Quando você vê seu amigo ao lado praticamente te agradecendo num olhar por tal momento. Quando todos entoam o mesmo refrão. Quando você não sabe onde por sua mão, que quer acompanhar o ritmo da bateria ao mesmo tempo em que quer empunhar a guitarra inexistente ou, simplesmente, ser erguida e balançada de um lado para o outro.
E, no fim, todos extasiados seguem em direção à saída quase não acreditando no que acabaram de ver. Faltam-lhes palavras, gestos e até os sentimentos não são suficientes para mensurar o que lhes ocorrera diante das retinas.
Foram reis que me deram o melhor dos presentes.

domingo, 19 de setembro de 2010

Estorinha de dois

A necessidade de escolher uma música para fofocar seu sentimento para ela se fazia presente. A inquietude das pernas por não saber caminhar com as palavras era tamanha que, por razões do coração -isto é, nenhuma - perambulava pela cidade ouvindo sua lista de músicas previamente selecionadas para o momento.
Sempre presente, as canções lhe pareciam corajosas, transparentes, transcedentes, multi-significativas... São o que ele queria ser, mas nunca teve a audácia de sê-lo de fato. Ele era aquilo: só um, comum, simplório, típico, um outro... mas diferente em sua semelhança com os demais.
O cabelo era comum, mas o penteado não. O corpo era mais um, mas o desenho não. As roupas eram típicas, mas a combinação não. Os tênis eram os de sempre, mas as solas eram gastas de forma diferente, pois seu andar era torto. O só um era um só, enfim.
O que sentia era forte. O céu, que mais parecia uma sacola plástica cheia de água recém rasgada por uma faca luminosa, fazia o papel de seus olhos. O sol disputava uma ponta da estória com ela, que lhe esquentava o peito e mais.
Ela também era daquele jeitinho usual, que, de tantos vestidos iguais pela cidade, de tantas blusas quadriculadas e de tantos óculos retangulares vistos por aquele litoral, quase nada fazia dela uma menina digna de destaque. Mas ela era. Talvez aquele par de sapatos vermelhos, talvez a beleza de seus lábios levemente pintados, talvez aqueles cabelos pretos de boneca... Por um apanhado de coisas desse tipo, certamente.
Ele nunca vira alguém assim. Ela já... vários. Vários tipóides como esse. Mas nunca conversaram, pois a canção certa nunca foi escolhida.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Três meses

Nunca passei dos três meses de experiência.
Nunca experimentei o "eu te amo" infinitamente sincero, embora já tenha achado que sim.
Nunca comemorei o Dia dos Namorados nem aniversário de namoro.
Nunca exibi uma companheira em uma reunião de família.
Nunca vivi as crises dos seis meses, do um ano, dos três anos etc.
O bom é que pode ser tudo numa tacada só. Ou vou amargar a velhice sendo o criador de cachorros sem filhos ou mulher da vizinhança.
Mas nunca sozinho.